Porque não bato nem toco nada. Rsss ;)
“Ayabá”, segundo quem me ensinou, é um nome utilizado para fazer referência e prestar reverência aos orixás femininos. São nossas rainhas. Segue o vídeo, que eu quero falar umas coisinhas. Mas não antes que se veja. Que as minhas palavras cheguem depois da percepção do vídeo.
Então...
Me deixem ser um pouco babaca um momento: Como faz pra roubar essa saia (e esse abdômen) da Gal?
... Pronto, acabei. Obrigada. Continuando.
Sendo ayabá referente aos orixás femininos, faltam então Nanã e Yemanjá. Ao menos dentre os orixás cultuados no Brasil. Nos comentários do vídeo existe uma teoria de que Nanã e Yemanjá realmente não fazem parte desse grupo, que existe algum fundamento etimológico na palavra Ayabá para que somente Oyá, Obá, Ewá e Oxum façam parte. Vale a pena entrar no vídeo pelo youtube também, para se inteirar melhor. Dentro da minha ignorância, eu não sei bater o martelo numa explicação que dê conta e peço desculpas humildemente.
Mas não sei até que ponto isso essa explicação é necessária para o post. Porque o vídeo está aí, e ele e a musicalidade falam por si.
Esse é um argumento meio falho, porque se for assim, não há a necessidade de escrever nunca nada a respeito de coisa alguma. E honestamente, não sei até que ponto esta afirmação não prossegue. No entanto existem as palavras, que vêm de todo o canto quando se vê um trabalho como esse. E o que se pode fazer é falar, e compartilhar palavras, ainda que não seja necessário. E é o que eu vou fazer a seguir.
Esse vídeo é retirado do filme “Doces Bárbaros”, de Tom Job Azulay. Trata-se de um documentário sobre o processo do show destes quatro artistas juntos num grupo e que, de súbito, ganha alguma dramaticidade pela prisão de Gilberto Gil e do baterista da banda por porte de drogas. É muito interessante, e talvez volte a ser postado como resenha do filme.
As músicas selecionadas para estes shows são na maioria de autoria de Gil e Caetano, e trazem uma relação direta com os ritmos populares brasileiros – chamados de regionais, termo que eu não sou lá muito chegada¹. Há nesse esforço uma tentativa de usar ritmos fortes, consolidados e extremamente marginalizados pelo circuito da cultura nacional, como os ritmos caipiras e os de origem afro. Neste sentido, temos na faixa “As Ayabás” um exemplo marcante: É toda referente ao Candomblé. No som, na letra e em todo o processo.
Oyá, a bailarina, a borboleta, o próprio vento, anunciada por sua filha Bethania e cantada por Gal Costa, “quebra seus pratos” e dá cadência às que vêm a seguir. Abre corajosa, de peito aberto. E passa a bola para a destemida amazona Obá, trazida por Caetano Veloso, com seus feitos heróicos e sua triste orelha cortada. Linda à sua maneira, simples, com uma inevitável potência, nos leva de pé sobre o seu cavalo para a moradia da solitária Ewá. Aquela que vive distante de todos, silenciosa, dona de tudo que é inexplorado. E é revelada suavemente pelo Xangô de Gilberto Gil, este sedutor que canta a menina enquanto se encanta pelos seus modos. E então, todos cantam para mãe Oxum, rainha suprema na Bahia, mãezinha doce, acolhedora, temperamental. Dona das riquezas, da fertilidade, e com uma ligação direta com o culto das Iyá-mi.
Sobre as Iyá-mi, meus caros... Tanto melhor que não saibam muito, se não quiserem se comprometer com a religião. É um tipo de culto muito difícil, muito denso e de muito fundamento. O que eu posso dizer superficialmente é que é a força feminina do culto de orixá. O pássaro proibido. A feitiçaria e o domínio de tudo quanto é obscuro, oculto. É o controle do sangue das regras das mulheres. É o material corpóreo, a vertigem. É vida e morte ao mesmo tempo.
Ao trazer quatro mulheres desse culto, pode-se pensar que se está evocando tudo o que é ligado às Iyá-mi. Pensar em evocar esse domínio do feminino, este tipo de pensamento numa época como a da ditadura militar, por exemplo. Existe alguma pertinência nisso.
E principalmente, ao pensar que a religião foi criada e desenvolvida no país pela mãos de mulheres, cantar para as moças, além de um tributo a essas mulheres, avisa também da sua potência. Ao fazer sentir cada um desses axés femininos, os Doces Bárbaros batem cabeça para o princípio do penetrável e vão buscar uma nova ordem cultural, musical, social e política.
Motumbá
Helena
1: Porque ao pensar que estes são ritmos podem ser caracterizados como regionais, pressupõe-se que exista uma outra categoria de ritmo que não seja regional, que seja “global”. E, sendo global, fala a todos, enquanto o outro só fala a uma minoria. Leva a um pensamento de que o global é um tipo de saber construído mundialmente, comprovável, científico, enquanto regional é necessariamente primitivo, parado no tempo e é um tipo de manutenção de práticas inúteis e desprovidas de qualquer tipo de raciocínio. E não é por aí. O global tem as suas origens, que coincidem com seu espaço de desenvolvimento. Todo global é local porque parte de algum lugar. O que torna mais divulgado e mais conhecido – e nem por isso compartilhado – é a política, a academia, a economia, e não o saber em si.
0 comentários:
Postar um comentário